Obra: “A persistência da memória”, Salvador Dali,
1931. Óleo sobre tela, 24cmx33cm. MoMa, Nova York, EUA.
Falamos em nosso texto anterior sobre a relação dos
sonhos com a arte, tratando um pouco da perspectiva psicanalítica e destacando
a obra “O sonho de Constantino”, de Piero
Della Francesca. Para nosso texto de hoje evoco novamente os escritos de Freud,
principalmente o trabalho que abriu a psicanálise para o mundo: “A
interpretação dos sonhos”, obra publicada em 1900.
“A interpretação dos sonhos” abriu caminho novo,
impactou e revolucionou uma época e continua a estender seu campo de ação na
contemporaneidade. Analisando as noções sobre o sonho até então elaboradas, Freud
lança seus porquês, cujo principal questionamento reside nas perguntas: os
sonhos possuem um significado? Este pode ser interpretado? Simpatizando com a noção popular de que os
sonhos possuem um sentido, ele tece um método de interpretação dos sonhos, fundamentando-os
na linguagem do inconsciente e explicitando a ligação existente entre sonhos e
a realização de desejos reprimidos.
Admirador dos clássicos, Freud era colecionador de
antiguidades e escreveu textos sobre Leonardo e Michelangelo. No entanto, as concepções
de Freud acerca dos sonhos e do inconsciente afetaram a produção de artistas de
vanguarda das primeiras décadas do século XX. Movimentos artísticos e
literários exaltavam a obra do pai da psicanálise, mesmo que este “pai” não
fosse entusiasta da produção artística de vanguarda. Como já dito
anteriormente, em matéria de arte, Freud preferia os clássicos.
O surrealismo emerge oriundo de vários movimentos anteriores,
como o dadaísmo. Em comum nesses movimentos estava a ruptura com cânones
estabelecimentos e uma abertura a novas linguagens e representações. Para os
observadores da época essas inovações eram incômodas, estranhas, sem sentido,
desconexas. Sem uma narrativa de conteúdo de sentido manifesto, pareciam-se
muito com a trama de um sonho.
O sonho instiga um campo fértil de produção para o
movimento. Salvador Dali (1904-1989) é um dos artistas que mais se destacaram
nessa linguagem. Podemos ver na tela “A persistência da memória” um cenário
estranhamente onírico, com relógios de bolso moles, formigas, um litoral vazio,
melancólico e uma figura inusitada com imensos cílios, de olhos fechados. Que tempo é esse, que a imagem manifesta? Um
tempo que escorre, fluido, líquido. Um tempo que, ao buscamos agarrá-lo, escapará
de nós.
(publicado também no segundaopiniao.jor.br)
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