segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Fim, começo, eternidade


“Sentimos e experimentamos que somos eternos”. Encontro esta citação da ética de Espinosa durante a leitura do delicioso A vida humana, do filósofo André Comte-Sponville. 
Desejo de eternidade, desejo de não morrer. Existe uma tendência no humano de querer controlar os fluxos do existir, de querer controlar o porvir. No entanto, apesar de todas as objeções e vontades de continuidade, sempre existe o momento do fim. 
Um assunto tem rendido muito pano pra manga ultimamente: “o fim do mundo”, baseado na profecia Maia. Pelo mundo afora pessoas estocam velas e alimentos na ânsia de sobreviver aos dias difíceis. O diretor do Observatório Astronômico do Vaticano apressou-se em acalmar os fiéis. Na Rússia, diante da percepção de um pânico crescente, o ministro responsável pelas situações de emergência assegurou que o mundo não acabará dia 21 próximo. 
Há tempos esse imaginário encontra profusão. A narrativa bíblica fala de um apocalipse anunciado pelas trombetas dos anjos e a partir daí, muita desgraça. As imagens do Juízo Final de grandes artistas como Jan van Eych, Michelangelo e Hieronymus Bosch são assustadoras em seus suplícios. Em várias culturas, narrativas e imagens sobre o fim são cultivadas há muito tempo.
Novos fins serão anunciados. O que extrair daí? A possibilidade de começar.
Uma enfermeira australiana relatou em um livro chamado Antes de partir as angústias de pacientes terminais. Pessoas que realmente estavam no fim da jornada. O que eles disseram? 

Disseram que queriam não ter trabalhado tanto, que queriam ter tido mais tempo para os amigos, para a família. Queriam ter tido a coragem suficiente para viver uma vida verdadeira, não a vida que os outros esperaram que eles vivessem. Uma vida com mais sentimentos, uma vida mais feliz. 

Não somos eternos. O fim inevitavelmente chegará. Até lá existe a possibilidade de viver a eternidade do hoje, com todos os seus começos.
(artigo publicado no jornal O Povo, edição de 17/12/2012)

Um comentário:

Anônimo disse...

Suas reflexões me lembraram duas músicas que rimam com essa temática.

uma é óbvia (Titãs - Epitáfio): http://www.youtube.com/watch?v=L3eiOMQVUqs

e com a outra eu esbarrei esses dias e tem muito nela pra pensar (Julieta Venegas e Lenine - Miedo): http://letras.mus.br/venegas-julieta/999421/