quarta-feira, 14 de julho de 2010

Como nos filmes de amor

No primeiro mês do século XXI eu estava de férias, percorrendo várias cidades do sul do Brasil. Estava em uma cidade do interior de Santa Catarina, a qual não recordo o nome. Após caminhar bastante procurei um café agradável para recuperar a energia para continuar a caminhada. Estava no meio da tarde e eu poderia caminhar ainda umas duas horas e selecionar um local bem bonito para ver o pôr do sol. O café era rústico, paredes brancas, portas de madeira pesada com alguns sulcos que lhe conferiam um ar antigo, utensílios de cozinha reconfigurados de seu uso habitual para servirem de enfeite, vasos de cerâmica com flores amarelas dispostos pelo ambiente. Pedi um coquetel de café e enquanto saboreava a bebida observei o lugar. Um casal que estava ao meu lado chamou minha atenção, pois era nítida a atração dos dois. Como se estivesse com uma câmera dei um close nos olhos dela. Castanhos com rajadas verdes. Os olhos destacavam-se do conjunto e eram realçados pela maquiagem bem feita: consegui identificar três tons de sombra, provavelmente oriunda de um kit já pronto para facilitar a aplicação em degradê. Linhas pretas feitas com delineador contornavam os olhos. Entretanto, aqueles belos olhos conheciam apenas o homem ao seu lado, nada além dele interessava a ela. Fui discretamente ampliando o alcance de minha lente imaginária: ela usava um tom de rosa suave nos lábios, os cabelos escuros fartos, compridos e levemente ondulados caíam pelos ombros, trajava um vestido azul marinho, bem ajustado ao corpo. Era bonita. Sentada com as pernas cruzadas, seus sapatos altos de vez em quando afundavam na areia, pois estávamos no jardim do café. Seu perfume brigava um pouco com o das flores do lugar, mas sempre vencia. Se o corpo fala o dele falava tudo para ela, sussurrando afetos e talvez coisas que apenas um homem que deseja muito uma mulher é capaz de falar, que pela distância não pude ouvir, apesar de ter me esforçado muito para isso. Ele não era bonito, mas era gentil como um homem em extinção, como um homem que possui a consciência do valor de uma mulher bem amada. Eles me fizeram sonhar com esse amor. Eles me fizeram crer que é possível. E fui ficando, admirando a cena, usufruindo da energia de uma união que vibrava, sem me dar conta da passagem do tempo, coisa que só acontece quando estamos felizes. Quando saí de lá, já não era mais a luz do sol que banhava a cidade, era a luz da lua, aberta, nova, prateando a cena do casal de namorados caminhando de mãos dadas para um destino que não tenho mais como narrar, mas imagino que continuam felizes, dez anos depois, como costuma acontecer nos filmes de amor.

3 comentários:

Dayalesson Torres disse...

Que belo texto! Levou-me a muitas reflexões, como:
Será que esse amor existe?

Por que os homens perderam tanto a sua maneira gentil de ser ?

Acho que minha visão de mundo está ficando meio pessimista,paciência.

Minha linda, grande beijo...

Saudades...

Ana Valeska Maia disse...

Amigo Dayalesson, existe sim!
Não fique pessimista. E lembre-se: você pode ser esse homem em extinção.

Anônimo disse...

Conhecí este olhar há muito tempo
atrás. Olhar que perdi por não ter
sabido amar... Levarei este olhar
comigo para sempre, mesmo que nunca mais o veja.