segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Joana explode e define limites

Ainda não é o momento. Não dá para seguir o movimento das asas azuis. Sei que a criatura alada saiu de dentro de mim, então a borboleta azul sou eu, mas não dá. Não com essa sensação amalgamada na alma de uma profunda, gigantesca, avassaladora pena de mim mesma. Não com essa penúria, com esse espírito pedinte, que perambula deplorável, miserável demais, não com essa tristeza que esmaga, que eu tento extirpar de mim, e vou fundo, no escaninho da alma, no baú guardado no porão mais longínquo mas a danada foge, inventa artimanhas, ardis e escapa, fazendo novos estragos, tecendo caminhos, e daí não param de aparecer portas, enquanto eu inocentemente acreditava que a busca tinha acabado em um dos rápidos momentos de alívio para meu sofrido coração.

Estou cansada. Machucada demais. Sem fôlego para o combate. E sem paciência para os rótulos. Nem para o céu que me prometem. O céu dos outros não me interessa. Nem o seu. Saiba que nenhuma máscara encontra encaixe na minha face. Assumi minha humanidade despedaçada, revelo meus frangalhos, minha vida minada por dentro, tenho nojo de representar, não tenho vocação para atriz nem para o ofício de poeta, que é o mais cruel e nefasto de todos, o poeta segue manipulando as palavras, falando o que não sente, assim como você, que é um grande fingidor de dores e amores. Por isso, você, em sua vida tranqüila e feliz, faça a gentileza de não me oferecer conselhos. Eu não quero saber de suas receitas. O pior é que você parece acreditar na comédia que representa. Nem sabe que é ator. Exibe um sorriso largo, tanto imagina que é feliz, repete tanto para si que é feliz, mente, mente, mente que acredita na veracidade da felicidade que sente. Pois eu te digo, meu amigo: teu jogo é uma prisão.

Quanto a mim, não sei jogar (nem quero) esses patéticos jogos de adultos. Não aceito ser cooptada. Sigo, enquanto preciso for, aos frangalhos, catando os pedaços por aí. Pelo menos pedaços eu tenho, posso ser uma colcha de retalhos e você? Tem pedaços? Consegue se ver? Então, respeite a dignidade da minha tristeza estampada e não olhe mais para mim e pergunte um ridículo tudo bem? Você não tem condições de saber de mim, pois não sabe nada de você mesmo. Portanto, deixe-me em paz e siga o ideal de seu mundo burguês, de plástico, falso, falso e siga feliz. Nunca mais, portanto, venha oferecer conselhos para quem assume a alma despedaçada. Se quiser falar comigo, venha sem máscaras, entendeu?

5 comentários:

eDu Almeida disse...

ai ai Valeska, assim como Joana, eu tb estou colocando limites onde até então não tinha força para fazê-lo. Se a Joana soubesse o quanto ela me inspira. Conheço eu essa Joana? Ou a Joana somos eu e vc?
Parabéns mais uma vez.

Ana Valeska Maia disse...

Somos nós sim, para quem se permitir conhecer. Todos tem um pouquinho da Joana por dentro. Ultimamente ela anda me habitando demais, buscando, buscando... o que vamos encontrar ainda é mistério, por enquanto vamos caminhando, caminhando...

gloria disse...

Acho que nasci táo nua e assim fiquei. Quem tem a nudez por condição diante de tudo que é vasto, muito e intenso se sente quase se derramando. eu dou às mãos a Joana, porque perdi as vestes e nunca soube encaixar muito bem as máscaras. te ler é como te ouvir: é quase um sussurro. bjs

Ana Valeska Maia disse...

Você entende porque sente a linguagem Glória, tua viagem é tão profunda que transborda.

Ana Valeska Maia disse...

e que bom que eu posso desfrutar das tuas linhas ao vento...