domingo, 25 de agosto de 2013

Os sabores do palácio

Leio as notícias envolvendo as novas performances palacianas do governador Cid Gomes e me surgem as mais diversas associações. Primeiro, as palavras do título desta crônica, que peguei emprestado de um recente filme francês, com narrativa inspirada na vida da chef do presidente François Mitterand. 
Como em todo bom filme envolvendo a arte culinária, há a exuberância visual nos pratos, a combinação perfeita de ingredientes, a imaginação que flui guiada pelo aéreo dos aromas, levando o espectador a, literalmente, lamber os beiços.
Outra associação surge. Desta vez a liga é com o filme Maria Antonieta, dirigido por Sofia Coppola. Durante o filme, há o desenvolvimento das tramas da sociedade de corte, o desfile de vaidades, materializado em roupas, joias, bibelôs, perucas, sapatos, futilidades. Presença constante também da exaltação dos prazeres do corpo, inclusive o prazer de usufruir de banquetes com cardápio sofisticado.

Volto aos dissabores das performances palacianas na Terra do Sol e procuro juntar os fragmentos das associações. No tear, fio por fio, uno o contrato de milhões de reais envolvendo o Governo do Estado e os serviços de um buffet especializado. Entrelaço o povo miserável da França revolucionária do século XVIII com o povo cearense vivendo o rigor da travessia de um tempo de estio. Tranço as semelhanças entre o esbanjar dos nobres retratados na história, caracterizados como uma elite alheia ao sofrimento popular e percebo que existem muitas semelhanças no presente dos representantes “democráticos”. E, ontem e hoje, se alguém ousar evidenciar os excessos da farra, sempre existe um grupo de bajuladores palacianos para defender os interesses do rei.
Assusta o alcance da dissociação da mentalidade de quem considera o luxo das recepções, viagens e construções megalomaníacas a coisa mais natural e benéfica do mundo. Mentalidade de quem assume a posição de dono da coisa pública e que banca os requintes dos sabores do palácio com o dinheiro dos outros.

(crônica publicada no jornal O Povo, edição de 23/08/2013)

Ana Valeska Maia Magalhães

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