“O mar
da história é agitado”, escreveu Vladimir Maiakovski. Há dias este trecho do
poema vez ou outra retorna aos meus pensamentos, como as ondas do mar que
avançam e recuam. Acompanham o recordar do poema as lembranças do dia 03 de
janeiro. Observei as portas dos comércios fecharem, a cidade paulatinamente
assumir um cenário de feriado decretado às pressas, impulsionado pela onda de
boatos. Um clima de medo circulando, invadindo linhas e entrelinhas, fazendo
morada por dentro da gente.
Este
dia foi especialmente inquietante por estabelecer conexões de sentido com outras
reflexões tecidas sobre medo e liberdade. Como se todo o desconforto acumulado
pelo crescimento ostensivo da sociedade de controle tivesse jorrado. Como se
fosse a gota a mais que faz a água transbordar do copo.
Transportando
a ideia do movimento das ondas para as construções humanas, podemos reconhecer que
nossa liberdade convive com o proliferar dos sistemas de vigilância. A rotina
flui abraçada à necessidade de controle determinada pelo medo. Avançamos
desenvolvendo tecnologia, recuamos sitiando nossos espaços de liberdade. Crescemos
em consumo, agredimos o meio ambiente. Garimpamos
espaços de inclusão, criamos zonas de exclusão.
O fato
é que estamos juntos neste mar. Em águas agitadas ou calmas, devemos aprender a
navegar atentos às nossas histórias entrelaçadas. O medo não pode nos fazer
parar, nem podemos permitir que nosso espaço de liberdade seja determinado pelo
outro. No entanto, existe o movimento da onda. Ser livre não é fácil. A liberdade pode ser um
ideal muito apreciado, queremos que ela avance, mas um dado que não pode ser desprezado
é que temos receio dela. Ser livre significa ser senhor de si, assumir a
consequência de suas ações. Exige autonomia e capacidade de resistência. Clama
um sujeito criativo. Neste momento, muitos recuam. Convém lembrar: “Há sempre
um copo de mar para um homem navegar”, anunciou o poeta Jorge de Lima. Fundamental
navegar, abrir caminho, mesmo que seja
em um copo de mar.
(artigo publicado no jornal O Povo, edição de 16/01/2012)
Um comentário:
ser livre não é fácil...
-suspiro
que texto lindo, forte e importante.
Obrigada pelas reflexões.
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