quinta-feira, 9 de setembro de 2010

O gesso do tempo

Nunca tive nada engessado em meu corpo. Nem braço, nem perna. Nada em mim fraturava. Na infância essa foi uma frustração imensa, pois eu achava o máximo ver a popularidade das meninas engessadas na escola, desfilando impiedosamente seus braços e pernas coloridos, cobertos de desenhos e declarações de afeto. Elas pareciam ter um ímã (que era o gesso obviamente). Na procura de meu cenário de atenções tentei cair, pular, escorregar e nada funcionou. Os ossos estavam firmes e fortes. Tive essa fortaleza interior até me apaixonar pela primeira vez, aos 11 anos, pelo meu colega de sala na sexta série, chamado André Luiz, que tinha olhos verdes profundos, meio de ressaca, como os da Capitu. Bastava uma olhadela do moço que eu me desmanchava inteira. Por meses, dediquei todo meu romantismo cultivado por anos para minha love story nascente. Foram noites imensas tecendo sonhos de amor perpétuo ouvindo a seleção de minhas melhores músicas em fita K7 e desenhando corações pelos cadernos. Quando enfim me toquei que meu amor não era correspondido, senti no fundo da alma a falta de um gesso que remendasse meu coração partido, que fizesse calar a dor íntima, extraída e espalhada por dentro de mim. Para curar esse tipo de dor, apenas o gesso do tempo.

2 comentários:

Unknown disse...

Quem é que não sentiu esse tipo de sensação (amor nao correspondido) naqueles belos e saudosos tempos de colégio? Sonhar todos os dias com um encontro, um beijo, que nunca aconteceria, com a amada colega de sala de aula. E quanto nao sofriamos quando chegavam as férias e por longos dias iriamos deixar de ver aquela que nosso coraçao insistia que permanesse dentro dele. Belo texto Ana Valeska.

Carlos Quezado disse...

Ana,
Quem que nunca sentiu essa sensação de amor não correspondido, durante os belos e saudosos tempos do colegio? Quantas vezes não ficamos sonhando com um beijo apaixonado que nunca aconteceria? Bons tempos aqueles que, infelizmente, os adolescentes de hoje não se permitem sentir essas otimas sensações. Mesmo que algumas paixões parecam utopias, valem a pena sentir. "É melhor ter e perder que nunca ter amado".