“ver é sempre ver mais do que se vê”
(O visível e o invisível, Merleau-Ponty)
Foi um grão? Um cisco? um pássaro? um avião? foi algo super.
Não sei qual a origem do atrito, da ferida, não encontrei meu agressor, não pude penalizá-lo. Senti apenas a conseqüência da invasão. Ardeu, doeu, ceguei e chorei.
Não senti meus olhos vendo.
Entretanto, foi bom. Agradeço a invasão.
Não restou alternativa: olhei para dentro!
Senti finalmente o que Merleau-Ponty mostra em O olho e o espírito, que a visão é o meio que me é dado para ser ausente de mim.
Quero dizer que existe uma armadilha na visão.
Sim, ver pode ser traiçoeiro!
A visão pode ser uma forma sofisticada de cegueira.
Todos os dias recebemos um bombardeio de imagens. Um mega espetáculo visual. O apogeu da ilusão que nos faz cegar para o óbvio: todo excesso é perigoso.
Gostamos do poder de criar, gostamos de afetar o outro, de ter o poder de convencer , de seduzir e muitas vezes não queremos parar ou equilibrar alguns processos. O mundo da proliferação de imagens é um vício da sociedade de consumo e nele mora uma prisão.
Estamos repetindo o trágico caminho de Narciso?
Que bom que parei e olhei para dentro. A verdadeira visão requer profundidade.
Novamente Exupéry sussurrou (pois todo ensinamento é baseado na repetição): “o essencial é invisível aos olhos”.
Ser livre é poder olhar a vida por um outro ângulo.
É poder dizer não.
É poder dizer sim.
É criar um imaginário único no mundo.
É poder ser o autor de sua própria história.
Viver a vida, como diz meu amado Warat, de acordo com meus próprios sentidos.
O que encontrei no meu visível invisível?
imagem: Narciso, de Caravaggio.
10 comentários:
Um ponto indeterminado no tempo
Muito antes de qualquer era conhecida
Surgiu um sentimento
Que predispõe alguém a desejar o bem de outrem
Nas gélidas terras... O amor surgiu.
Perdura até os dias de hoje esse ato de desejo
Que leva alguns a loucura
E a outros leva ao paraíso
O condutor da evolução
Sentimento não explicado, só sentido...
A força do movimento que gerou a condição
Para a humanidade se manter em atividade
Desde o ontem
Até o hoje...
"I dreamed a dream in time gone by
When hopes were high and life worth living,
I dreamed that love would never die
I dreamed that God would be forgiving
ótimo Ana, um texto rápido e certeiro. Muito bom.
As vezes estou pensando coisas aqui, que vc traduz por ai...
Beijos.
O que me encanta em você, (Jo)Ana, é a capacidade de transformar tudo, inclusive a dor e a angústia, em arte. Rimar amor e dor contraria o poeta, quando a dor sentida se transfigura em amor, pela tessitura do teu verbo sensível e amorável.
Beijo grande deste blogólatra incurável,
Jô.
gente, muito grata pelos lindos comentários!!!!
Exposição do invisível?
E eu que estava incomodado por estar me sentindo meio cego...
Daniel,
O bom da palavra é que ela pode expor o invisível.
Eduardo,
que bom que você está incomodado com a cegueira. É sinal que está crescendo.
voltar para o invisível é sempre o melhor jeito de enxergar com mais profundidade, longe das "ilusões" que a visão nos reflete.
Engraçado como o essencial é simples, a gente que complica.
Belíssimo texto e reflexão, parabéns!
Ilton
Senti e pude reconhecer o quanto sou cego... hehehehe... é como um clique, um encontrar ao ler esse texto, "meu problema é cegueira!", fui transportado para "O ensaio sobre a cegueira", onde tudo é branco e nada vejo... meus olhos precisam ver o invísivel, o essencial e ele não está neste turbilhão de imagens ilusórias, que chamamos de real, está em minh´alma, na construção de um novo olhar sobre o mundo.... :). Ótimo texto e obrigado por me conduzir ao oftalmologista... hehehe... um forte abraço.
Novamente Exupéry nos fala:
o essencial é invisível aos olhos.
bjs procês.
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