segunda-feira, 22 de abril de 2013

Sorria, você caiu na armadilha


Posso colocar teu nome no check in? Estranhei a pergunta, um pouco por não compreender no primeiro momento do que se tratava, um pouco por, ao compreender o sentido da pergunta, sentir o incômodo de ter que exibir minhas escolhas de entretenimento para pessoas que nem conheço. Disse um sim meio acanhado para não ser do contra, para não causar mal-estar.
No entanto, o mal-estar ficou comigo, incomodando, inquieto, lançando seus porquês. Afinal, por que preciso dar satisfação aos outros? Publicando onde estou, o que estou fazendo, o que estou vestindo, até o que estou comendo? Por que é importante ser visto? E não é para ser visto de qualquer maneira. É importante que você esteja feliz, fundamental que as imagens exibam como você é amado pelas pessoas, como é um profissional competente, como possui uma família linda e perfeita. Jorro de clicks e sorria, você caiu na armadilha.

Paradoxo de nossos dias: lutamos tanto por liberdade e agora prestamos conta de tudo o que fazemos. Somos paparazzi de nós mesmos. A armadilha? O desejo de existir na contemporaneidade. E atualmente existir é documentar o que se faz. Ter liberdade demais é deixar de pertencer a um sistema. Deixar de pertencer é deixar de existir. Qual o teu perfil como consumidor? Você declara espontaneamente, constantemente, em seus check ins, nas imagens que posta no universo virtual. Ao fazer isso, você também é um objeto de consumo. O consumidor-objeto.
Pertencemos a uma civilização da imagem que documenta as experiências, registra os instantes e prende a alegria. Lembro de um vídeo francês que mostra a história de um casal que tinha o hábito de registrar tudo, passeios, viagens, coisas do dia a dia. Até que um deles se dá conta de que não estavam vivendo. A relação acaba, pois nunca existiu, era falsa, era só imagem. É um exemplo extremo, o que acabei de dar. Ou talvez seja realmente necessário resistir ao sofisticado sistema de controle que nos afeta. Devolver a liberdade ao desejo e também a nós mesmos.

(crônica publicada no jornal O Povo, edição de 22/04/2013)

2 comentários:

Wilton disse...

Adoro passear pelas suas reflexões...

Sérgio Costa disse...

São os tais "quinze segundos de fama" pelos quais a gente tanto quis por tanto tempo. O mal da internet, e das tecnologias portáteis é isso: escravos de check-ins, comentários...

Não vou mentir e dizer que não faço isso também, mas não sou desses ultra-compulsivos por facebook e etc. que dão satisfações até da hora que vão ao banheiro. Dia desses encontrei uma arte muito interessante de uma propaganda: um iPhone transformado em uma prisão. Genial! Expressa bem os tempos de hoje, onde filmar o show parece ser mais importante do que assistir com os próprios olhos, sem a intermediação da câmera.

Saudade de passear pelo seu blog, Ana! Beijo grande!