segunda-feira, 9 de abril de 2012

Viver as perguntas

“Talvez depois, aos poucos, sem que o perceba, num dia longínquo, consiga viver as respostas”, escreveu Rainer Maria Rilke em uma das cartas direcionadas a Franz Xaver Kappus, o jovem poeta. Após a leitura das cartas de Rilke, fiquei refletindo um bocado, recordando alguns momentos em sala de aula, quando foram lançadas perguntas aos estudantes. A reação comum consiste em querer apressadamente encontrar as respostas adequadas. “Calma, a resposta certa só chega quando você viveu intensamente a inquietação da pergunta”, costumo dizer.

Viver as perguntas. Tarefa difícil em um mundo com tantas fórmulas de sucesso e felicidade. Ser feliz ultimamente parece ser uma obrigação e ficar triste uma ruína. “Por que deseja excluir de sua vida toda e qualquer inquietação, dor e melancolia, quando não sabe como tais circunstâncias trabalham no seu aperfeiçoamento?”, argumenta Rilke.

Tenho observado como o barrar a angústia com medicamentos está na moda, para a alegria da indústria farmacêutica. Claro que existem muitos casos em que os remédios são necessários. No entanto, existem nítidos abusos no uso de medicamentos. Outro ponto de inquietação reside em observar pela Cidade tantos anúncios de cursos que prometem transformar a vida da pessoa, com programas e ferramentas para “quem quer investir em si mesmo e mudar de vida”. Às vezes prometem fazer a grande transformação em um fim de semana.

Costumo desconfiar dos modismos com fórmulas fáceis. Afinal, viver é difícil. Somos mistério profundo porque somos o que lembramos e, sobretudo, somos o que esquecemos. Herdeiros do que não sabemos, do que não temos controle, aprendendo todos os dias a harmonizar o mundo de fora e o mundo de dentro. O mistério do caminho de cada um está também na essência da poesia incrustada nas perguntas, por isso é tão precioso vivê-las, olhando para dentro de si à procura das respostas verdadeiras. Essa tarefa nenhum outro pode realizar. Cabe, definitivamente, a cada um. 

Artigo publicado no jornal O Povo, edição de 09/04/2012

2 comentários:

Anônimo disse...

quero agradecer a Sra Ana por tirar uma grande venda antes existentes em meus olhos,coisas que jamais me perguntaria nem até ao meu eu...e as respostas como e para que pressa se a cada instante pensante a 1{ pergubta se renova para segunda e assim sucessiva mente o mais importante não são respostas e sim uma inquietude sem limites obrigada por essa nova experiencia a que devo prosseguir ao longo de minha nova carreira...
Por Josy de Sousa

Paty disse...

Ah, mas é isto mesmo. Às vezes a gente fica tão tentado a eliminar tudo que causa mal, a ficar sempre em paz, quando, na verdade, essas sensações opostas se complementam, e juntas nos tornam pessoas melhores...

Sempre achei que sem a tristeza nunca poderia de fato haver alegria, e esses bordões típicos. Eles são clichês, mas nem por isso deixam de ser verdadeiros.

Viver é, de fato, difícil. Post bem escrito, que me lembrou fragmentos de Clarice Lispector... doída, ela era ao mesmo tempo capaz de celebrar.

Abraço! :)