segunda-feira, 29 de março de 2010

O coração partido do herói

Shakespeare já fez falar pela boca do príncipe Hamlet que existem mais mistérios entre o céu e a Terra do que nossa vã filosofia é capaz de alcançar. Portanto não almejo aqui esmiuçar as várias abordagens que o filme “The book of Eli” traz. Posso dizer que a vida é um jogo imemorial e existem vários dados desse jogo expostos no filme, como as mitologias de guerra e as mitologias de paz; e a percepção das narrativas bíblicas, ruminadas tantas vezes em outras searas nos conflitos entre luzes e trevas. Novamente um mundo pós-apocalíptico, devastador, com seres humanos vivendo em um ambiente similar ao estado de natureza hobbesiano, configurando a “guerra de todos contra todos”. E o conhecimento alvo de cobiça por ser uma ferramenta de manipulação e de libertação. Como espectadores, vamos seguindo os passos de alguém que tem a certeza de sua jornada de herói, um andarilho com um propósito firme e inabalável de cumprir uma missão. Herói que é, prepara cuidadosamente as armas de combate e seu corpo é coberto de cicatrizes, marcado por lutas anteriores. Podemos dizer: “já vimos esse filme antes!”, e o que me fisgou não foram as recapitulações com novas roupagens das mesmas histórias, ou talvez tenha sido exatamente isso, provavelmente o que me cativou foi a recapitulação da cena mais antiga de todas, a do estar só consigo mesmo, profundo e intimista momento na existência em que constatamos que ninguém virá nos salvar e que mesmo aos frangalhos, nós continuamos , acreditamos em outro mundo possível e que essa tarefa cabe, definitivamente, a nós mesmos. Foi essa a delicadeza do filme que mais me tocou. A vida é tecida por fragmentos e no meu ofício de tecelã incorporo essa cena à tessitura de minha colcha de retalhos. Segue, pra você, Denzel Washigton interpretando o herói com o coração partido.



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