terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

O trem das cores e das memórias vividas na vida do agora


Pensamos e repensamos, fazemos e refazemos, criamos e recriamos. Em um momento em que parei para ver o tempo, para simplesmente sentir recordei as palavras de Edgar Morin: “Quantas pessoas não acreditam trabalhar para o bem, sem perceber que na realidade estão sendo manipuladas?” e, quando eu me pego mergulhada em questionamentos deste tipo, vislumbro poucas saídas, poucos caminhos saudáveis a percorrer diante de relações de poder tão opressoras. Como ter certeza de nossas certezas? Será que compreendemos os desafios de nossa existência contemporânea se estamos envolvidos por uma percepção da realidade que é mantenedora da ordem excludente e destrutiva e somos servos muito dóceis da permanência deste sistema opressor. Nesses momentos a lembrança da arte me conecta novamente com a vida além das angústias e por mais paradoxal que pareça fico tranquila por não ter certeza de minhas certezas. “Não tenho certeza de nada, mas a visão das estrelas me faz sonhar”, afirmou Vincent Van Gogh. Escuto o som do trem que sempre passa ao lado da minha casa e me vejo passageira do mundo, vendo e sendo vista, criando e recriando, como o trem das cores do Caetano,

A franja na encosta

Cor de laranja

Capim rosa chá

O mel desses olhos luz

Mel de cor ímpar

O ouro ainda não bem verde da serra

A prata do trem

A lua e a estrela

Anel de turquesa

A emoção invade tudo, pois é esse o meu modo de mundo: perceber tudo o que pulsa em cada canto, todos os detalhes, minúcias insignificantes, encontrar a grandiosidade no aparente ínfimo, saber onde está escondido o coração de cada ser e com a voz da música do trem chegam as luzes e as cores de todas as janelas que eu já vi passar e a memória faz festa.

As casas tão verde e rosa

Que vão passando ao nos ver passar

Os dois lados da janela

E aquela num tom de azul

Quase inexistente, azul que não há

Azul que é pura memória de algum lugar


imagem: Paulo Amoreira

5 comentários:

Katsuo disse...

Minha amada, seguir a voz do coração é sempre o caminho e a forma de agir corretos. Nós dois sabemos disso, não é? É normal achar que pode estar-se a fazer o bem por influencia do mal. Sofremos tantos estímulos diários que acabamos nos perdendo nestas horas. Mas fico feliz em saber que temos a voz do coração um do outro para nos falar e colocar de volta em nossos trilhos dessa viagem que se chama vida.
A voz do meu coração sempre estará pronta e apta a te falar.
Te amo <3

Rodney Barreto disse...

Refletir acerca da realidade pressupõe dor! Preferimos nos "acomodarmos" a nos "incomodarmos" com uma crítica ao Ser das coisas. Não obstante, existe algo que dever ser investigado antes, até, da incomodação. A saber, o que de fato preferimos?

Será que a nossa preferência por algo é verdadeiramente nossa? Para enquadrar melhor tal questão dentro de um universo de possibilidades, cito, a lógica capitalista. Desde cedo aprendemos, com o senso comum, que "questão de gosto não se discute!". Somos lapidados, e essa é a palavra, a preferi o que a lógica capitalista nos impõe, porém não necessariamente de maneira violenta, mas muitas vezes de maneira carinhoza, delicioza, prazeiroza, de modo que não percebamos as algemas e as modarças e assim continuemos a “preferir”, com a ingenuidade de acharmos estarmos cientes de que o “gosto” é nosso.

Perdeu-se ou não se tem, ainda, a consciência de que devemos consumir para sobreviver e não, viver para consumir! Quantas vezes somos escravos dos desejos, que no seu âmago, não são nossos de verdade, mas foram impostos sutilmente, pelas palavras retóricas de um apresentador de TV, ou de uma propaganda alucinógena qeu nos incita a compar, ou a ver, ou a ter?

O fato é que saber disso tudo dói, porque temos medo de sentirmos angústias, o que não deveria nos assustar, pois é da natureza humana angustiar-se com alguma coisa! Tudo nos afeta de algum modo, devemos achar a melhor interpretação de mundo para nós mesmos.

Aline Lima disse...

que lindo!!! postei uma coisa que estava sentindo baseada na frase do van gogh que vc colocou aqui...um "céu de um azul celeste, celestial", para vc ana linda!!!

Valdecy Alves disse...

Schopenhauer dizia que a arte é a única forma de encontrar alívio para o fardo que é a vida. Discordo dele que a vida seja um fardo, mas que a arte tem o poder de libertar-nos, na arte todos somos deuses. Ah! Tem. Está certa a maioria dos poetas que mais que compreenderam a vida, sentem-na, vivem. Encerro o meu comentário com o poema que inspirou a Nona Sinfonia de Beethoven e nela é cantado, que celebra a vida, que tantas reflexões nos provoca. Inclusive filosofar. Eis o poema de Schiller:

Barítono)
Oh amigos, mudemos de tom!
Entoemos algo mais agradável
E cheio de alegria!

(Barítonos, quarteto e coro)
Alegria, mais belo fulgor divino,
Filha de Elíseo,
Ébrios de fogo entramos
Em teu santuário celeste!
Teus encantos unem novamente
O que o rigor da moda separou.
Todos os homens se irmanam
Onde pairar teu vôo suave.
A quem a boa sorte tenha favorecido
De ser amigo de um amigo,
Quem já conquistou uma doce companheira
Rejubile-se conosco!
Sim, também aquele que apenas uma alma,
possa chamar de sua sobre a Terra.
Mas quem nunca o tenha podido
Livre de seu pranto esta Aliança!
Alegria bebem todos os seres
No seio da Natureza:
Todos os bons, todos os maus,
Seguem seu rastro de rosas.
Ela nos dá beijos e as vinhas
Um amigo provado até a morte;
A volúpia foi concedida ao verme
E o Querubim está diante de Deus!
(Tenor solo e coro)
Alegres, como voam seus sóis
Através da esplêndida abóboda celeste
Sigam irmãos sua rota
Gozosos como o herói para a vitória.
(Coro)
Abracem-se milhões de seres!
Enviem este beijo para todo o mundo!
Irmãos! Sobre a abóboda estrelada
Deve morar o Pai Amado.
Vos prosternais, Multidões?
Mundo, pressentes ao Criador?
Buscais além da abóboda estrelada!
Sobre as estrelas Ele deve morar.

Franzé Oliveira disse...

"Silenciar uma opinião é um mal peculiar.
Se a opinião é correta, somos roubados
da oportunidade de trocar o erro pela verdade;
e, se está errada, somos privados de uma compreensão
mais profunda da verdade em sua colisão com o erro".

(On liberty - John Stuart Mill)

Beijos menina.