quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

O segredo das águas do tempo


Ontem estava desarmada de minhas vontades investigativas e fui apenas observar o pôr do sol e foi neste instante desarmado que uma intrusa chegou mansamente. Hipnóticas, as águas subiam e engoliam o território seco de meu repouso contemplativo. A invasão despertou o desejo de beber das águas do tempo e fazer melhor caminho. Conectar-me com o que pulsa no segredo das horas no transcorrer do tempo além do tempo. Perceber o que está camuflado no que se permite exibir. Sempre há uma porta que se quer aberta ou que precisamos enfrentar na travessia de nosso destino. O segredo não quer ser segredo para sempre e o oculto tem sede de revelação. Caminhei pelo rio e já não era mais a mesma, ele flui, eu fluo, encontro-me em delírio, pulsação de um heraclitismo intenso, tenho o destino das águas que me atravessam. Eu sou o que me move e mergulho porosa no caos da ordem cosmológica da vida, nos ciclos solares e lunares, no ocultismo das estrelas e na lógica de deuses e deusas transcendentes. Vivemos de mitos e sempre buscamos a origem de nossa luz. Já é noite em meu céu e vejo as estrelas, a lua e a chave do mundo que gira sem parar e eu procuro a chave que está sempre a rodar, a esconder-se de mim no rodopiar eterno da vida. Mergulho no rio e permito que a corrente da profundidade me leve para o encontro com a passagem, que é o sentido do tempo que passa por mim e me atravessa por todas as vidas que vivi e que aprendo a cuidar, como o pai que envelhece, o filho que nasce e o espírito que eternamente busca o reecontro. É longa a viagem e a vida não passa pela janela. Passado, presente e futuro avante!


Imagem: fotografia de Paulo Amoreira: http://www.fotolog.com.br/daimon

2 comentários:

Eduardo Matzembacher Frizzo disse...

Nada é linha quando se fala de tempo. Nada é estático quando se fala de vida. Heraclitiano com toques estóicos tento ser. Mas o senso investigativo do qual falaste quase sempre me toma com sua lógica infernal dentre conceitos que somente confirmam o que disse Jaime Vaz Brasil: "A casa de cada frase alberga o duplo ao porão." Porém, temos sempre de ir, já que antes do poente relampejam mãos que cansaram dessa demora racionalista untada em óleo e sangue. Estou com o Marcelo Camelo: "é preciso força pra sonhar e perceber que a estrada vai além do que se vê". E você, se não visitou à Dante esse além, seja debaixo ou de cima, ao menos provou das suas águas que jamais criam limo, que jamais estão para poços, já que o dis-curso se dá ito) quando as águas dos poços enfim unidas desvelam o sentido de significação infinita nos entremeios dos cronópios que tentamos ser. Devíamos montar uma faculdade de Direito, minha cara. Ou seria melhor uma instalação, um projeto artístico? Pensando bem, fico com o segundo intento, apesar do primeiro me descer como cachaça há vários anos. Um beijo, Eduardo.

Ana Valeska Maia disse...

Eduardo, você borda com as palavras. É lindo.