domingo, 6 de setembro de 2009

Nós (ou o lamento da triste despedida de um amor)


Um domingo de Sol é você todo. Pela milésima vez afasto os pensamentos, mas é inevitável. No dia mais iluminado do ano chega a clara visão: nossos nós pesam. Ficaram maiores desde que nos separamos e continuam a crescer com o tempo. Difíceis de desentranhar. Nós aos pedaços. Quem dera fossem frouxos. Seriam mais fáceis de lidar, desataríamos os nós e poderíamos fazer laços bonitos por aí com a parte que coubesse a cada um. Mas não são. Serão nossos nós tão apertados ao ponto de estarem cegos? Nós cegos são cárceres. Nada flui no imenso oceano de nós mesmos e ficamos prisioneiros de um minúsculo- infinito mundo particular. Parados, peixes petrificados esperando algum milagre que desfaça os nós. Ou um herói-marinheiro que mostre a rota para navegar melhor nesse mar. Difícil sem desencalhar o navio. Enquanto isso, vou juntando os cacos. Parecem com o corpo do pão que peguei para comer e que se esfacelou em minúsculas migalhas. São cacos leves de mim. Qualquer mínimo vento ameaça levar os pedaços e para não me perder de vez e correr o risco de não mais me encontrar fico quietinha entregue apenas ao movimento da memória que nada no contra fluxo da maré do tempo. Em mim moram as lembranças de nossos nós poéticos, melífluos, cúmplices, lapidados, quando nossos corpos se entendiam e nossas almas desnudavam-se e os fragmentos ocasionais não assustavam, a vida tinha tanto encantamento, cor e luz que nossa solda era eficaz e delicada, qualquer parte partida era imediatamente colada sem traumas. Meu amor, doeu fundo o erro que cometeste e a punhalada que me deste pelas costas. Por isso você me fazia colares com cacos de vidro? Era anúncio, aviso, presságio bélico de nossos nós unidos para serem partidos? É triste quando se quebra um laço de amor. Ficamos à mercê da benevolência do tempo para dissolver a metamorfose dos nós, o coração vai se recompondo de pedaço em pedaço, em retalhos. DE-VA-GAR. De vagar em vagar passo a passo segue o tempo e permanece um engasgo, um nó preso bem no meio da garganta, nó intenso, especialmente gigante, nesse lindo domingo de Sol.
Imagem: "namorados", obra de Ismael Nery

8 comentários:

Anônimo disse...

Linda crônica.Desatar nó cego é um trabalho hercúleo.Amálgama cujo entreleçamento dói feito dor de amor dilaçerado pela incompreensão do objetivo inacançável. Vera.

Joice Nunes disse...

um texto bonito e triste. o tempo desata os nós, através do desgaste. amo você.

Ana Valeska Maia disse...

Coisa boa receber a visita da mãezinha e da Joice-flor.
Amo vocês!

Elan Lopes disse...

Os nós apertam e as vezes ficam cegos pois atar é a finalidade de um nó. Nó folgado não tem muita utilidade. Até tem, mas sua função é diferente. Nós folgados não são intensos, não se aprofundam, não amarram. Tem uma crença que quando o nó está muito difícil de desatar uma pequena assopradinha nele o desamarra na mesmo hora. Bom, talvez devamos aprender a ser mais pacientes e deixar o tempo dar essa sopradinha, ou talvez devamos fazer como os marinheiros e aprender a atar vários tipos de nós, um para cada objetivo e função. Beijo grande.

Fulvio Ribeiro disse...

Lindo menina como sempre,estava com saudades, já tinha um tempinho que não vinha até aqui.
Grande Abraço.

Anônimo disse...

"Eu to tentando remar meu barco" no meio dessa maré alta que tem me atormentado, é que assim como você, sei bem como é triste quebrar um bonito laço de amor e se transformar em um nó que aperta a garganta, o coração, os sentidos.
Estou tentando jogar p fora desse coração tudo o que PASSOU, tentando convencê-lo que "as coisas novas também são boas" (tarefa que me exige um ENORME esforço) por que em mim sobrarão restos tentadores; lembranças de um tempo bom, momentos inesquecíveis que não saem da memória, mas que escaparão das mãos, promessas... e quantas promessas foram feitas entre olhares misteriosos, silenciosos que pronunciavam tudo.
Hoje saudade é sentimento fiel do meu coração, saudade de tudo isso, inclusive do que poderia ter sido e é por isso que "Eu rabisco o sol que a chuva apagou", porém minha razão não é cega, vê que o desejo do meu coração, cada vez mais, se distancia de mim e que já não há mais nada a fazer. Vivo procurando por respostas e concluo que existe, coisas que não se explicam... simplesmente acontecem e diante dessa situação, a mim resta a amarga alternativa de se desfazer de meu sonho colorido e encantado, que foi esfacelado em mil pedaços por alguém que por ele não se interessou.
Na minha lucidez vou cuidando de mim, das cicatrizes que estão no meu teimoso coração, com o objetivo de poder um dia voltar a estar com o Peito BEM ABERTO outra vez. A mim resta o RECOMEÇO e ao céus faço pedidos para que mande embora essa "solidão que é fera, que devora" essa "amiga das horas, prima irmã do tempo, e faz nossos relógios caminharem lentos, causando um descompasso no meu coração" que esta sim se perca de mim, de uma vez por todas.

Assim estou eu; TENTANDO, TENTANDO... tentando tocar a vida para FRENTE e esperando receber o melhor dela.
"Eu tô tentando ser felizzz..."

Beijos e boa sorte!!!

Fernando Bacelar disse...

Esse, como te disse, foi difícil para mim. Primeiro, a "árvore de natal". Depois, eu cada vez mais me encontrando no texto. Parava, dava um tempo, recomeçava... sem coragem... não estou em épocas de enfrentamento.

Lindo, Val. Me tocou profundamente.

Lindo.

Milena Neves disse...

Querida! Belo texto, me vi nele, com lágrimas nos olhos. Continuo juntando meus cacos, só espero que não tão devagar.