segunda-feira, 10 de agosto de 2009

O que vejo hoje?


Segunda-feira vem com força de começo.
Um começar que indaga: o que vejo hoje?
Alegoria da Caverna, Matrix , Ensaio sobre a Cegueira, “Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara”, nos aconselha o Livro dos Conselhos. Quantos já falaram, anunciaram, avisaram que estamos cegando, míopes ainda ou já completamente cegos? Em cegueiras escuras ou leitosas andamos a nos arranhar e esbarramos pelo caminho.
Filosofia chinesa, yin e yang, taoísmo, Heráclito, Pascal, Buda, Kant, Leibniz, Spinoza, Marx, Jesus Cristo, Joseph Campbell, Freud, Edgar Morin (esse rol está longe de ser exaustivo), os aqui citados e tantos outros seguem anunciando sentidos, lançando luzes em nossas cavernas e quais as lentes que escolhemos? Normalmente uma que nos permite ver apenas um quadradinho bem pequenininho: a lente do consumo.
Essa é a lógica do saber reducionista, que, por exemplo, isola as emoções do trabalho científico e fomenta um olhar de consumo irresponsável, faz criar um sentido de realidade baseado no dinheiro e no poder como os caminhos que nos conduzirão para o encontro com a felicidade.
A fragmentação do olhar impede de ver a linha que costura os sentidos no tecido de nossa vida. A realidade mutilada cria a ilusão de que estamos mais lúcidos, enquanto cegamos para uma visão sistêmica da existência.
Falar em refugiados ambientais não é novidade para os brasileiros, principalmente para quem nasceu e teve que lidar com a realidade do sertão nordestino. Mas o que está acontecendo um pouco distante de nós, com os habitantes do Atol de Carteret é um anúncio do que está por vir em proporções bem maiores. Durante décadas a população residente lutou contra as águas que subiam e engoliam devagar a vegetação e as casas dos moradores. Agora, não tem mais como administrar o resultado do aquecimento global, das alterações climáticas. A única solução é ir embora enquanto é tempo.
Quantos desertos teremos que atravessar para ver o óbvio? Quantas enchentes teremos que enfrentar? O quanto a lógica do consumo tapa a nossa visão e sabota a nossa sensibilidade? Se nos embrutecemos, como, realmente, viveremos? Não tem saída: a humanização das relações sociais passa pela sensibilidade de um olhar que perceba que os fios de nossas construções, as linhas que utilizamos para construir nosso conhecimento, nossa vida, nossa história, deveriam servir para construir um olhar apto para traçar uma trajetória a nos enlaçar uns com os outros pelas linhas do afeto e conduzir também para uma relação afetuosa com o planeta que nos abriga.
Ainda existe possibilidade de cura para nossa cegueira coletiva. Muitos estão passando a enxergar melhor. Então, te pergunto, o que você vê?

Obs: O Atol de Carteret forma um conjunto de seis ilhas pertencentes a Papua-Nova Guiné. Os 2.600 habitantes do atol deverão ser retirados do local, (a transferência das famílias já começou) pois a previsão é que em 2015 o atol estará totalmente submerso.

Imagem: filme “Blindness”, com direção de Fernando Meirelles e baseado no livro “Ensaio sobre a cegueira”, de José Saramago.

4 comentários:

Elan Lopes disse...

Minha visão ainda é borrada, mas acredito já começar a ver vultos. As influências do sistema ainda são fortes, mas minha batalha é diária e meio adotei parte do bushido apresentado no Hagakure de Yammamoto Tsunetomo: servir e descobrir nesse ato a grandiosidade do mesmo. Não é nada fácil, nem cômodo, mas o caminho não é a comodidade lembra-se? E assim como o passarinho que leva no bico água para apagar o grande incêndio na floresta, acredito estar fazendo a minha parte.
Beijo grande.

Anônimo disse...

(Jo)Ana,
Que bom que esta postagem sua trata sobre a atual crise civilizatória em que estamos todos mergulhados. Que bom e que sirva de alerta para abrir nossos olhos e mudar nosso padrão de consumo. Que bom e que nos faça abrir os olhos para a natureza e que, amando-a e respeitando-a, possamos nos entender como parte dela, como cuidadores dela, como responsáveis por ela, pela vida em todas as suas dimensões, em todas as suas criaturas. Oxalá seu alerta - que é o mesmo de Leonardo Boff, que tem sido um profeta ao denunciar as mazelas desse sistema e a nos chamar para uma mudança de natureza ética, política, comportamental - nos tire da cegueira em que muitos estamos condenados.
Beijo grande nesse coração agora e sempre bem verdinho,
Jô.

Ana Valeska Maia disse...

É Elan a vida é a grande escola. Todos os dias aprendemos.

Jo, um beijo grande para você, cada vez mais me conecto com a teia da vida e você é um dos responsáveis pelos meus passos.

paulo amoreira disse...

.uma outra conversa possível: http://overtebral.blogspot.com/2008/11/da-cegueira-clarividncia-ou-breve.html

.saudades de te ver.