sábado, 11 de abril de 2009

Vovó, o amor e o brilho das estrelas


”Vovó, você precisa apagar todas as luzes para ver o brilho das estrelas”.
Joana me falou essas palavras com os olhos mais tristes que eu já vira em todos os olhares que me fitaram durante minha longa vida. Eu, que já tenho 80 anos.
Colocamos nossas almofadas perto do lago e apagamos todas as luzes do sítio. Joana deitou, aconchegando a cabeça em meu colo e passou quase uma hora em silêncio, concentrada no que lhe falavam as luzes do mundo das estrelas. Enquanto Joana refletia, eu acariciava seus cabelos, como costumava fazer desde que Joana era bem pequenininha.
Aliás, no mundo das vovós, as netas nunca crescem.
“Foi o amor, vovó, que me fez ver o real brilho das estrelas. Conheci a luz do amor através do brilho daquele olhar. Quando meu olhar encontrou o brilho daquele olhar tudo fez sentido. Aquele brilho me enfeitiçou. Foi perdição, foi encantamento. Fiquei prisioneira do sentimento. Eu só tinha olhares para aquele olhar, me perdi pelos labirintos das sombras daquele olhar que eu amei. Entende porque dói vovó? Porque aquele olhar não quis mais olhar pra mim e não querendo mais olhar pra mim o amor me fez ver o brilho das estrelas. Eu passei a navegar pelo mar escuro ou a caminhar pelas sombras e lá não existiam velas, candeeiros nem faróis. Todo espaço na Terra estava incerto pra mim. Então fui obrigada a olhar para os céus e na escuridão da Terra vi como é o realmente o brilho das estrelas”.
Depois Joana ficou novamente em silêncio. No sítio som não existia. Nada fluía das árvores. Nenhum barulho de mato. E nunca ninguém falou tanto quanto aquele silêncio. Um silêncio de prece. Uma tormenta afônica, castrada, e a avó de Joana desejou a cura do coração partido da neta com a potência de um coral de mil vozes, com a força de uma orquestra de mil instrumentos, “vai passar, Joana, vai passar, daqui a pouco não doerá mais”.
Depois de ter chorado tudo o que tinha para chorar, Joana pegou sua almofada, acendeu as luzes do jardim e entrou em casa levando a foto da avó nas mãos.

7 comentários:

paulo amoreira disse...

.que estrelas internas ocultamos de nós cada vez que vemos suas luzes refletidas nos olhos do outro?.

.joana inicia seu jornada estelar através do único caminho possível de trihar: sua fé no que virá.

.mais à frente o que espera tem asas abertas: tudo mais será.

Anônimo disse...

só sabe quem viveu esse amor...
Luana

Franzé Oliveira disse...

Belo texto menina. Encantador. Gosto vir aqui. Bjos com carinho.

gloria disse...

essa avó-símbolo do colo generoso e quente vem para mim através da imagem da mào de Deus de Rodin. Cada vez que uma dor fica vasta, difícil de ser carregada eu me imagino deitando e sendo acarinhada por essa mào que-tudo-abranda. bela imagem linda Valeska, quase um quadro feito de palsvras. bjs

eDu Almeida disse...

Eita moça, falando de silencio, de palavras, de dores; parece que tudo está no mesmo tom. Agora entendo o porque da semelhança que vc descreveu no meu texto.
Gosto muito d ti viu? Esquece disso não que é importante.
Bjos.

Wellington Pereira disse...

Para que palavras e escritos, se tudo foi tido e escrito nas estrelas. Talvez até o afago contra dores e perdas... Muito lindo! Bjs...

Nayara disse...

lindo texto lindo lindo lindo..
faz bem para a alma frequentar esse seu cantinho ali!